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O cantor Leonardo Gonçalves “causou” mais uma vez nas redes sociais. Em seu Twitter, postou um longo “fio” (https://bityli.com/dOISIi) em que sustenta a tese de que
os pioneiros do adventismo desconfiavam de instituições, mantinham o princípio da “luz progressiva”, e afirma que a palavra heresia “não tem lugar na tradição adventista”. Leonardo afirma também que “todo adventista que usa essa palavra [heresia] ou não sabe seu significado, ou não conhece a nossa história”. Deixaremos para tratar do conceito de “luz progressiva” e do suposto anti-institucionalismo em nosso próximo post desta série.
No dia seguinte ao post do Leonardo, o autointitulado “reverendo” André Gonçalves, que é pastor nos Estados Unidos, veio em defesa do irmão e reforçou os argumentos dele. Sabe a estratégia do “se colar, colou”? Pois é. Eles jogam um “o adventismo tem evitado”, como se meia dúzia de progressistas fossem o adventismo. A intenção de colocar a instituição sob suspeita e negar a existência de heresias em nosso meio claramente atende à necessidade de ajudar o amigo Edson Nunes, ex-pastor da comunidade Nova Semente que, juntamente com os colegas da Terceira Margem do Rio, Leonardo Gonçalves, Tiago Arrais e outros, têm, sim, disseminado heresias nas redes sociais há alguns anos. Por isso, para que não fique a ideia de que o adventismo corresponde ao que esse pessoal pensa, vamos explicar biblicamente e na história do adventismo o que significa heresia.
A Bíblia usa a palavra “heresia” (do grego “hairesis”). No contexto do Novo Testamento (NT), heresia é um grupo ou uma divisão provocada por diferença doutrinária, ou diferença de opinião sobre certos temas, um “partido” religioso. Heresia pode ser uma seita, facção, partido. Nesse sentido, os saduceus são chamados de “a seita [heresia] dos saduceus” (At 5:17), e os fariseus, “a seita [heresia] dos fariseus” (At 15:5).
Paulo foi acusado de ser “o principal agitador da seita [heresia] dos nazarenos” (At 24:5). Ou seja, o cristianismo inicial era visto como uma seita (“heresia”; At 28:22). Em sua defesa, Paulo admite que segue “o Caminho, a que chamam seita [heresia]” (At 24:14), mas que antes havia sido “fariseu conforme a seita [heresia] mais severa da nossa religião” (At 26:5).
O NT mostra que há, sim, espaço para divergências internas e convicções particulares (Rm 14, por exemplo). Mas isso não precisa nos dividir. Nesse sentido, as próprias divisões é que são “heresias”, fruto da carne (Gl 5:20), e não as diferentes opiniões.
Mas “heresia” no NT também se refere a falsos ensinos, falsas doutrinas, à negação das verdades básicas. É nesse sentido que Pedro denuncia os falsos profetas e os falsos mestres, “os quais introduzirão, dissimuladamente, heresias destruidoras, até ao ponto de renegarem o Soberano Senhor que os resgatou” (2Pe 2:1).
Provavelmente, seja nos dois sentidos (divisões e falsos ensinos) que Paulo usa o termo aqui também: “E até importa que haja entre vós heresias, para que os que são sinceros se manifestem entre vós” (1Co 11:19 ARC).
No NT há muita correção de erros doutrinários. E a dureza do discurso e da postura de Paulo em Gálatas mostra que existe, sim, um ponto de corte (“Anátema!”). No NT vemos respostas às alegações de estoicos, epicuristas e protognósticos. Há verdades fundamentais, e a igreja primitiva “perseverava no ensino dos apóstolos” (At 2:42). Ou seja, havia uma unidade de crença básica na igreja primitiva. Paulo, por exemplo, admite que estava transmitindo o que recebeu (1Co 15:1-5).
O motivo para essa preocupação do NT é que, fora do espaço seguro para diferenças de opinião, há ensinos e crenças que contradizem Jesus e negam a revelação divina. Por exemplo, relativizar a autoridade da Bíblia como Palavra de Deus, ou negar que Jesus Cristo é o Verbo que encarnou é negar ensinos básicos. Claramente, estamos diante de uma “heresia”, um falso ensino, no sentido bíblico.
Porém, a palavra “heresia” ganhou outros sentidos ao longo da história (ex.: protestantes são “hereges” na avaliação católica). A palavra “heresia” foi usada para perseguir? Sim. Mas continuou sendo usada para designar falsos ensinos.
NA HISTÓRIA DO ADVENTISMO
Os mileritas também usaram a palavra “heresia”, tanto para descrever ensinos errados quanto para denunciar a perseguição que os supostos hereges sofriam. Charles Fitch aplicou “Babilônia” às igrejas protestantes por causa do seu sectarismo, suas heresias e sede de poder.
Joshua Himes não viu problema no uso da palavra “heresia” para descrever erros doutrinários (por ex.: Sign of the Times, 1840, p. 5).
O Day Star (15 de abril de 1845, p. 37) denunciava a infiltração de “heresias” entre os mileritas.
A Review and Herald (por ex.: 16 de fevereiro de 1860) anunciava, dentre outros livros produzido pela editora, o Modern Spiritualism; its Nature and Tendency – an able exposure of the heresy, e outra obra contra a “heresia” do “no-sabbath”.
Tiago White usou a palavra (por ex.: Sermons on the Coming and Kingdom of Our Lord Jesus Christ [1870], p. 89) para se referir às “heresias de nossos dias”.
John Andrews usou (por ex.: History of the Sabbath [1873], p. 331) para se referir à “no-law heresy”.
Uriah Smith também usou (por ex.: Synopsis of the Present Truth [1884] p. 194).
E. J. Waggoner também usou (por ex.: Prophetic Light [1888], p. 117).
O Handbook for Bible Students (produzido pela IASD) usou (p. 102), e uma pesquisa no site Adventist Archives revelaria centenas de ocorrências da palavra “heresia” no sentido de falsas doutrinas.
Ellen White usou abundantemente a palavra “heresia” (verifique no site Ellen White Writings). Ela chama de “heresias” crenças erradas de seus dias e crenças erradas que apareceriam no futuro. Por exemplo, negar a ressurreição dos ímpios era parte dos “erros grosseiros que Satanás introduziu nas heresias dos últimos dias para servir a seu propósito de arruinar vidas. Esses erros não se harmonizam com a mensagem de origem celestial” (T1, p. 411, 412).
O Bible Readings, o estudo bíblico mais famoso da história do adventismo, utilizava diversas vezes a palavra “heresia” no século 19. Diversos periódicos adventistas utilizavam a palavra “heresia” para se referir a falsos ensinos, antes e depois de 1863.
NISTO CREMOS
O livro oficial Nisto Cremos também utiliza a palavra “heresia”. Ao descrever o dom profético, diz que ele foi dado para a edificação de indivíduos e da igreja, “protegendo-os das heresias e unificando-os nas verdades bíblicas” (p. 279). Além disso, reconhece que Paulo advertiu contra “futuras heresias” (p. 358), e denuncia as “perigosas heresias” que resultam de práticas espíritas (p. 429).
TRATADO DE TEOLOGIA
O Tratado de Teologia (outra obra oficial da IASD) usa a palavra “heresia” para se referir a erros históricos, como o gnosticismo (p. 52, 160, 394), o montanismo, o marcionismo (p. 54), monarquianismo, modalismo, arianismo e outras cristologias (p. 161), o docetismo (p. 214). Fala de uma “heresia em Colossos” (p. 563), e até em “combater as heresias” (p. 611; cf. p. 623).
Apesar de reconhecer que a acusação de heresia foi utilizada para perseguir, o Tratado entende “heresia” como erros doutrinários também, como fica claro pelo uso do termo no tópico “Corrompendo as Doutrinas” (p. 1090).
O Tratado destaca dois problemas que a igreja enfrentou nos primeiros séculos: “A perseguição por um lado e o surgimento de heresias por outro” (p. 629), e que o desejo de impedir o surgimento de heresias se corrompeu e desfigurou a igreja (p. 630). Porém, reconhecer que um termo foi distorcido e mal utilizado não requer que abandonemos o uso dele, especialmente quando se trata de um termo/conceito bíblico. Por isso o Tratado de Teologia continua usando a palavra “heresia”.
Descrevendo os adventistas, o Tratado diz que eles “veem o sábado restaurado como uma verdade probatória providencial para neutralizar o dogma moderno da evolução, uma das heresias-chave do tempo do fim” (p. 982).
Portanto, não há que se questionar o uso da palavra “heresia” como se fosse uma negação da tradição(!) adventista. Os adventistas usaram e continuam usando, sem nenhum tipo de problema.
Por isso, Ganoune Diop está certo a dizer hoje que “o racismo é uma heresia, um ataque contra a verdade” (https://bit.ly/3PE5UnT). Ele usa a palavra “heresia” para denunciar o racismo, pois, de fato, é uma heresia e uma negação da doutrina bíblica, tanto quanto o é, por exemplo, afirmar que Deus teria falado com a terra ao dizer “façamos”, em Gênesis 1:26.
Não apenas a palavra “heresia” está entre nós, mas os hereges também. Como Ellen White disse em 1862: “Deve haver heresias entre vós, diz o apóstolo, para que se manifestem os aprovados. A verdade nunca parece tão verdadeira e pura como quando vista em contraste com o erro” (Review and Herald, 9 dezembro de 1862, p. 10).
Encerramos com uma advertência da profetisa: “Surgirão continuamente coisas que causem desunião, afastem da verdade. Esse questionar, criticar, acusar, julgar a outros, não é prova da graça de Cristo no coração. Não produz unidade. Tal obra tem sido desenvolvida no passado por pessoas que professavam ter maravilhoso esclarecimento, quando se achavam afundadas no pecado. Heresia, desonestidade, e mentira reuniam-se todas nelas. O tempo atual é de grande perigo para o povo de Deus. O Senhor está conduzindo um povo, não um indivíduo aqui e ali. Ele tem na Terra uma igreja que permanece na verdade; e quando vemos, não só homens, mas jovenzinhas, clamando contra a igreja, receamo-nos delas. Sabemos que Deus não as enviou, e todavia elas correram, e todos quantos não aceitarem suas ideias errôneas são acusados de combater contra o Espírito do Senhor. Todas essas coisas estão nos planos de Satanás, mas a obra de Deus irá avante ao passo que haverá agora e sempre os que trabalhem diretamente contra a oração de Cristo. A obra progredirá, deixando-os muito atrás com suas satânicas invenções” (Mensagens Escolhidas, v. 2, p. 78, 79).
fonte do texto retirado: https://www.facebook.com/AdventismoSolido/
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